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Em 1930, Loanda era uma urbe relativamente pequena, que contava pouco mais de 100 mil habitantes e o seus arraial partia da Fortaleza de São Miguel até ao Bungo, subia a Ingombota, acabando no hospital de D. Maria Pia de Saboia. Não tinha luz eléctrica, nem água canalizada e as ruas de terra batida da cidade eram iluminadas com candeeiros abastecidos diariamente com óleo de querosene por funcionários da Câmara Municipal. Não haver energia eléctrica nem água canalizada era algo “normal” para os padrões de vida da época. Por isso, as instituições funcionavam normalmente, não sendo excepção a Associação Académica do Liceu Nacional Salvador Correia, entidade que se desempenhava na organização de actividades recreativo-culturais e desportivas. Fundada em 1928 e até ao surgimento da Mocidade Portuguesa, a Associação Académica era uma espécie de federação desportiva, tais eram as suas realizações.
Naquela altura, a capital angolana já conhecia um razoável movimento desportivo, praticando-se essencialmente futebol, críquete, natação, remo e esgrima. A moda da época era praticar o que os cavalheiros ingleses praticavam. Os sportmen da urbe loandense imitavam os súbditos de Sua Majestade no que dizia respeito aos sports. Isto levava a que nos pelados da cidade, situados na zona dos Coqueiros, que era uma espécie de centro da cidade, não ligassem para outra modalidades. Para muita gente, os verdadeiros sports eram os de origem britânica.
Mas como as unanimidades não existem efectivamente, houve quem quisesse alargar os respectivos conhecimentos em matéria de modalidades desportivas. Uma dessas figuras foi o instrutor de educação física do Liceu Salvador Correia, de seu nome Daniel Pina Cabral, ele que era tenente da Armada portuguesas. Como a qualquer professor de Educação Física, o ecletismo estava bem marcado no seu DNA. Entretanto, entre os sportmen da cidade falava-se muito de um novel desporto criado nos EUA, no final do século anterior para ser praticado em ginásios e fundamentalmente no Inverno. Isto, quando as condições climatérica não permitissem que houvesse prática de Educação Física ao ar livre, como era comum acontecer nos estabelecimentos de ensino oitocentistas.
Não tendo origem british, o basquetebol a poucos importava na cidade. Na verdade, atribuíam-lhe milhentos malefício porque alegadamente violento… Ainda assim, o instrutor liceal não deu ouvidos às más línguas e a pretexto das festividades do 10.º aniversário do Sporting Clube de Loanda entendeu organizar uma partida de exibição de basquetebol, cujos rudimentos ensinava aos seus alunos. Na cidade nascida quase cinco séculos antes, havia também outros curiosos sportmen que não queriam se ficar pelo foot-ball, como então se grafava a palavra, pelo tennis ou por outras modalidades verdadeiramente destinada a cavalheiros, como eram as de raiz britânica… Então, sem campeonatos regulares de qualquer desporto, era comum um indivíduos dividir-se por quatro, cinco ou mais modalidades por puro recreio.
Pina Cabral organizou o desafio que mereceu anúncio no único jornal diário da época, A Província de Angola, antecessora do Jornal de Angola. Numa coluna designada Vida Desportiva, a notícia apareceu impressa em escassas linhas. “Segundo nos consta, deve realizar-se deste belo sport entre um team da Associação Académica [do Liceu Central Salvador Correia] e outro do Sporting Club de Luanda para a disputa de um pequeno troféu com o nome de Bronze Pina Cabral, o introdutor do basket em Luanda”, lê-se na nota perdida numa página da edição de 16 de Maio de 1930.
Na data marcada, 18 de Maio de 1930, havia uma partida de foot-ball bem próximo do local indicado para o de basket-ball. Ainda assim, o tenente Pina Cabral não desistiu. Provavelmente, sequer teve medo de que o “seu” jogo fosse completamente ofuscado. Com os pupilos, apareceu no Stadium do Ferrovia Atlético Club para medir forças com a turma aniversariante, a do Sporting de Luanda. Muitos curiosos marcaram presença para tomarem o primeiro contacto com a novel modalidade. No pelado do recinto onde a marinhagem de cruzadores ingleses e equipas de clubes locais disputavam renhidas partidas de futebol, corridas de ciclismo ou luta livre, “leões” e “estudantes” bateram-se com valentia, usando uma bola de… futebol! No final, 8-5 a favor da turma aniversariante! Desse modo, ficava furada a previsão d’A Província de Angola de 16 de Maio de 1930, segundo o qual “a Associação Académica, possuidora dum bom team, com vastos recursos técnicos e atléticos, fará, certamente, uma demonstração forte e cheia de emoção e os rapazes do Sporting vão esforçar-se para honrar as gloriosas cores do seu club opondo-lhe uma tenaz defesa”.
Na resenha da partida que, objectivamente, constituiu o marco histórico indicativo do começo do basquetebol angolano, o mais importante periódico da época escrevia, em 20 de Maio de 1930, que “a Associação Académica, embora batida, mostrou mais conhecimentos que o seu adversário. Sentia a diferença do campo e apoderou-se dum grande nervosismo quando via o Sporting marcar quatro pontos em poucos minutos”. Na mesma edição, o diário relata o encontro de forma entusiasmada: “Com uma verdadeira enchente realizou-se no campo do Ferrovia, fazendo parte das festas do Sporting Club de Luanda, o primeiro desafio de basket-ball realizado em Angola, entre o team da Associação Académica e o outro do club promotor. O jogo que decorreu animado terminou com a vitória do Sporting por 8-5, embora um score mais elevado de parte a parte tivesse defendido melhor a marcha do encontro”, lê-se.
O periódico agregou que se fazia “necessário a estes empreendimentos a boa vontade de meia dúzia de carolas que, não procurando vencer o adversário após uns escassos treinos, tem como fito vencer a resistência passiva de muitos incrédulos que há em Luanda e dentro de certos clubes. À iniciativa da simpática Associação Académica corresponderam o Atlético e o Sporting e certamente outros clubes enfileirar-se-hão ao lado destas três agremiações”. De um momento para o outro, a novidade desportiva do vetusto burgo estava nas bocas do mundo. De sorte que em 21 de Maio de 1930, o mesmo jornal voltou a referenciar o desafio de basquetebol, ao comentar uma partida de futebol disputada precisamente na tarde de 18 de Maio, enveredando pela inevitável comparação. “Na tarde desportiva de domingo, se o desafio de basket constituía a surpreza duma modalidade nova, o foot-ball era a certeza dum jogo brilhante e animado. (…) Tal não sucedeu”.
Foi assim que tudo começou. Até final de 1930 realizou-se apenas mais um desafio, no dia 1.º de Dezembro. Então, defrontaram-se os teams do Sporting Club de Luanda (a maior e mais eclética agremiação desportiva da época) e do Grupo de Escoteiros N.º 36 Diogo Cão. Até meados da década de 1940 foi mais ou menos assim. Ou seja, um jogo aqui, outro acolá, não perfazendo mais de meia dúzia de encontros por ano. Isto, até que em 1946 Benguela tomou a dianteira, fazendo disputar o primeiro campeonato distrital oficial da modalidade. Seguiu-se-lhe Luanda em 1950. Nessa senda, os primeiros Campeonatos de Angola realizaram-se em 1960, com o Sporting de Benguela a sagrar-se campeão. Depois tudo rolou com normalidade, havendo um engasgamento nos períodos que precederam e sucederam à independência nacional, em razão da guerra que provocou a fuga de muita gente na conhecida ponte aérea Luanda-Lisboa. A coisa correu tão bem que a partir de 1962 o campeão de Angola passou a disputar a fase final do “Nacional” português, algo que perdurou até 1974.
(*) Adaptado do livro Caminhos do Basquetebol (1930-1975) – Vol. I, da autoria de Silva Candembo, ainda no prelo.
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